Os gritos eram inconfundíveis e gigantescos, mas faziam apenas eco na minha cabeça como se fossem um zumbido no meu ouvido. Foi a última vez que consegui vir à tona da água para respirar, eu sentia-me zonzo e atordoado, apenas via a linha ténue que dividia o ar e a água ficar cada vez mais longe do meu alcance, nas restantes vezes em que abria os olhos, esforçadamente, apenas via a imensidão azul que me rodeava. Uma dor forte na cabeça apoderava-se do lado direito da mesma e à medida que ia submergindo conseguia notar uma estranha cor avermelhada que se misturava com o azul do mar. O meu antebraço direito também estava a latejar e o mesmo ardor preenchia as minhas costas, a minha coxa e o meu joelho do mesmo lado. Contudo, sentia-me dormente ao mesmo tempo e prestes a adormecer, coisa que eu tentava desesperadamente lutar contra. O processo estava a ir demasiado lento, começou por me escapar todas as forças que restavam no meu corpo que agora estava gelado e deixei-me levar, estava tudo tão leve, demasiado leve... Os olhos acabaram por ceder igualmente e sentia-me preso no meio daquela estranha tranquilidade. Pensei em tudo o que me era possível por medo de não o conseguir fazer de novo. Vi e revi a cara dela no meu interior como se fosse a única coisa que me mantivesse vivo, ela atenuava-me a ferida. Mantinha a cara dela acesa na minha mente para que se acontecesse alguma coisa pelo menos a imagem dela viria comigo, pensei eu. O medo conquistou-me e mesmo que quisesse chamá-la era impossível, a minha boca não me obedecia tão pouco. Tinha esta sensação terrível e desconfortável por todo o meu corpo, a garganta arranhava-me e o meu peito ia apertando cada vez mais. Um flashback trespassou-me e deparei-me a reviver todos momentos dos quais já nem me recordava mas que ainda estavam presentes no meu subconsciente: a minha mãe a pegar em mim enquanto eu chorava porque tinha caído ao andar de bicicleta pela primeira vez; o meu pai a chamar-me para ambos irmos dar um passeio ao Zoo tal como já lhe tinha pedido à imenso tempo atrás, ele arranjou tempo para mim - finalmente; lembro-me tão bem de como me caiu um dente nesse mesmo dia por comer uma sandes numa das tendas que lá existia. Tenho saudades dele, saudades do meu pai e da minha mãe juntos, a sorrir. Tive uma infância feliz, dentro dos possíveis, mas já nada permanece igual. Até o meu irmão se ausentou embora fosse ele o meu companheiro para tudo, em tempos atrás, muito atrás. Ambicionava ser como ele o que, se formos a ver bem as coisas, se tornou deveras ridículo! Mas nem isso deve de estar no topo da lista dele das coisas com que se deveria de preocupar. Provavelmente ele nunca chegou a saber de nada disto, eu sentia um respeito enorme por ele, um orgulho imenso que me contagiava sempre que me levava com ele a qualquer lado. Não é justo tirarem-me estas coisas desta maneira, aliás, acho que não estava à espera que isto acontecesse sequer. Nunca reparei bem no que estava a acontecer e ao que parece chegou de surpresa para todos, não é isso que me deixa maioritariamente infeliz mas preocupa-me o facto de parecer ser o único que realmente pensa nestas coisas, a que propósito? Masoquismo sobretudo. Afinal, pelo quê que estaria disposto a morrer? A minha mãe era uma boa razão, imprescindível até, mas embora o amor pela minha mãe seja incondicional era impossível não pensar que o meu coração dependia de uma segunda pessoa, e foi aí que me atingiu de novo. Mesmo antes de ter perdido a consciência, antes de tudo se tornar preto, antes de me porem um fim sabes qual foi a única coisa que me veio à cabeça? Tu.
que lhe aconteceu? perdeu os sentidos no mar? :$
ResponderEliminarestá muito bonito, mas também está trágico :/
ResponderEliminareu sei eu sei . mas mesmo assim ...
ResponderEliminarameeeeeeeei :o
ResponderEliminaré perfeito, como sempre, como todos, como tuuuuuuuuuuuu*
de nada :)
ResponderEliminarainda bem baby ;)