[Carolina]
A espera já durava dias e não havia forma de acabar. Sempre ouvi falar nos filmes desse género que se falarmos com os pacientes em coma eles nos conseguem ouvir e por essa mesma razão o tenho feito sempre que estou sozinha com o Gonçalo no quarto. Embora não tenha confirmado esse facto com o médico, pois sentia-me um pouco estúpida ao fazê-lo, falava-lhe sobre o meu dia e em maior parte da situação do Carlos. O médico garantiu que houveram progressos mas o tempo continua indefinido, poderia acordar em qualquer altura. Nesta situação que eu não controlava sentia-me dividida, o estado do Gonçalo acabou por estabilizar como tal decidi passar os dias com o meu tio, ainda que me causasse algum desconforto, mas a noite era sempre passada ao lado do Gonçalo o que me fazia sentir mal por não estar com Carlos.
Hoje de manhã recebi uma chamada da mãe do Gonçalo a contar que o médico se sente esperançoso e que as probabilidades de acordar do coma tornaram-se maiores. O tom de voz dela não enganava ninguém, conseguia sentir-se a alegria pelo telefone coisa que nestes últimos dias tem vindo a ser uma novidade. Um pouco da minha preocupação saiu-me de cima, imaginava cada vez mais a altura em que poderia voltar a falar com ele, tinha tantas saudades... se não chorava por essa razão então chorava por ver o corpo do meu tio a desistir um pouco mais da vida a cada dia que passa. Eu estava uma bagunça. Embora se esforçasse por nos fazer sentir bem ao mostrar o seu sentido de humor acerca da situação, era impossível ignorar o que estava diante de nós. Dizia sempre que independentemente do que acontecesse estava feliz pois iria reencontrar o amor da sua vida - Vitória, e eram a estas palavras a que ele se agarrava todos os dias.
A tarde passou calmamente em casa do meu tio. custa-me sempre um pouco encará-lo de novo e pensar no que ele era e como ele está. Mal tem forças para se levantar ou gesticular sequer, por essa mesma razão ele está deitado numa cama com tudo o que precisa. É raro a minha mãe sair de lá e é ela que toma conta dele maior parte do tempo, os papos que ela tem debaixo dos olhos eram prova disso. Ainda consegui conversar um pouco com ele visto que ele passa maior parte do tempo a dormir. Falamos sobre o tempo, não parava de dizer que se sentia bem pois os dias estavam de um sol radiante e que eu devia era estar a aproveitá-los. Nada nesta conversa me fez sentir tão bem quanto ele parecia estar, só pior... A minha mãe fez o almoço e acabamos por comer os três onde o meu tio se encontrava. Foi mais uma situação triste visto que a minha mãe teve que alimentar o meu tio por ele estar tão fraco, ambas sabemos que ele odeia mas tornámos aquilo na situação mais normal do mundo enquanto comentávamos as notícias que estavam a passar na televisão. Não posso dizer que fiquei satisfeita porque foi pouco o que comi mas as refeições que a minha mãe preparava eram sempre divinas. Quando acabamos ajudei a minha mãe a arrumar tudo e a lavar a loiça.
M.:'Então, tens alguma novidade?'
C.:'Hmm... Disseram esta manhã que as probabilidades tornaram-se maiores.'
M.:'Isso é muito bom!'
C.:'Sim, é.' - respondi seca, não havia outra maneira para falar deste assunto.
A minha mãe não me fez mais perguntas enquanto lavávamos a loiça. Fiquei a tarde toda com eles, embora o meu tio tenha adormecido e não acordou no resto do tempo em que lá estive. Pouco se passou, ninguém foi lá a casa como de costume, ninguém me ligou e troquei algumas palavras com a minha mãe, o básico apenas. Hoje foi mesmo um dia daqueles... Preparei um pão para levar para o caminho e dirigi-me novamente à sala.
C.:'Mãe, vou agora, está bom?'
M.:'Sim querida, toma cuidado.'
C.:'Liga-me se algo acontecer.' - estremeci pela escolha das minhas próprias palavras.
Abri a porta e fechei-a atrás de mim, ao mesmo tempo que comecei a caminhar comecei também a devorar o meu pão que se foi mais rápido que aquilo que eu desejava. Quando cheguei à paragem a camioneta já lá estava e apressei-me para que não fosse embora sem mim, já tinha os trocos preparados no bolso para pagar o meu bilhete. A viagem foi como o resto do meu dia: enfadonha e sensabor. Eram nove e meia quando entrei no quarto de Gonçalo e nada tinha mudado, literalmente. Esta era a hora em que normalmente eu falava a sós com ele, era a única parte do dia em que eu me sentia melhor só por pensar que ele me estava a ouvir mesmo não podendo reagir ou dizer-me alguma coisa. Respirei fundo enquanto me sentava ao lado dele na cama. Olhei-lhe com ternura e agarrei-lhe a mesma mão fria que antes tinha tocado.
C.:'Olá , já estou aqui de novo.'
já tinha saudades tuas!!!
ResponderEliminaraté eu linda ahah
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