20110926

Gonçalo is speaking # 12

   Afastei ambos os braços do corpo dela e envolvi-lhe a cara com as duas mãos, levantei-lhe a cabeça e encostei a testa dela à minha.
       G.:'Não vou a lado nenhum, confia em mim.'
   Dito isto olhá-mo-nos mais uma vez, eu sabia que ela estava em baixo mas não conseguia pensar noutra forma para a reconfortar, os meus lábios voaram até à sua bochecha e depositei lá um beijo calmo e demorado, ela corou e eu sorri-lhe. Levantei-me num salto e tentei habituar-me à da escuridão do quarto, fiz um esforço para tentar pôr o que tinha de arrumar no sítio. A Carolina enrolou-se nos lençóis, voltou a permanecer quieta, provavelmente estava sem forças. Para acabar com o ambiente terrivelmente pesado que pairava no quarto, abri um pouco a janela para que fosse possível entrar luz e ar. Mal o fiz a Carolina ressentiu-se e franziu a testa olhando-me aborrecida, subiu ainda mais os lençóis para que lhe tapassem a cabeça. Esbocei um sorriso. Peguei em todos os lenços de papel que lá estavam espalhados pelo chão todo, mas todo mesmo, e fui metê-los no lixo. Ao ver aquele monte de papel amachucado não admira que a Carolina esteja exausta e frágil, onde foi ela arranjar tantas lágrimas? Todos os bilhetes de melhoras, cartões e as flores murchas que lá estavam à algum tempo, acho, fizeram-me pensar que ela é que parecia a doente e não o tio, por essa mesma razão atirei com as flores murchas no lixo e os bilhetes e cartões guardei-os na prateleira que tinha no quarto. Havia roupa espalhada no chão à entrada do quarto da Carolina, peguei em tudo e pus na lavandaria. Quanto mais eu arrumava, o quarto parecia mais sujo porque encontrava sempre mais algo para limpar, arrumei as almofadas e levei os pacotes de comida para o lixo. Ao passar pela porta do quarto vi uma moldura na sua secretária pelo canto do meu olho, dei um passo atrás e fui na direcção da mesma. Estava caída e virada para baixo, peguei nela com curiosidade e vi que era uma foto nossa. Lembro-me tão bem desse dia, estávamos os dois com as cabeças encostadas e a sorrir, tínhamos acabado de participar numa luta com bolas de neve com os nossos amigos, ambos com gorro e kispo impermeável cheios de neve de cima a baixo. Foi um dos melhores dias que passamos juntos, sem dúvida. Embora tenha ficado um pouco triste por estar virada para baixo, sorri e pousei-a direita no seu sítio. Sem mais nada para arrumar ou limpar achei que o melhor era tirar a Carolina fora da cama, já estava na hora visto que não deve ter feito outra coisa desde que chegou a casa. Ela também tinha uma casa de banho no quarto e foi para onde me dirigi, entrei e preparei duas toalhas considerando que a minha mãe gosta de ter mais uma para o cabelo, a Carolina não deve de ser diferente. Escolhi a roupa que deveria de usar e pousei em cima do tampo da sanita. Finalmente fui ao encontro dela e sentei-me.
       G.:'Miúda, anda tomar banho e vestir-te sim? Já te preparei as coisas.'
       C.:'Oh Gonçalo, deixa-me estar…'
      G.:'És tão preguiçosa... Só tens que te meter debaixo do jacto de água, vais tomar banho enquanto eu vou lá abaixo e preparo o nosso lanche, quando chegar quero-te ver pronta, ouviste?'
       C.:'Sim, pai.' - sorriu.
   Dei-lhe um empurrão ao de leve, não fosse ela desmontar-se sem eu querer e ela sentou-se na beira da cama balançando os pés para trás e para a frente. Enquanto esperava por ela em pé de braços cruzados, reparei que em cima da mesinha de cabeceira algo brilhava e já tinha noção do que era, o meu coração pesou-me ainda mais no peito ao pegar no pequeno objecto. Era a pulseira que eu lhe tinha dado e a Carolina tirou-a. Os olhos dela seguiram todas as minha acções desde o momento em que a pus na minha mão, na cara dela estampou-se um pequeno sentimento de culpa e constrangimento. Sentei-me de novo ao lado dela e esta virou-se para mim. Apesar de ser normal ainda fiquei mais destroçado ao olhar para os olhos dela vermelhos, inchados e encovados de tanto chorar e não dormir. Também estava pálida e podia jurar que tinha emagrecido, afinal quanto tempo passou?
       G.:'Acho que isto é teu.'
   Peguei-lhe no pulso de aspecto frágil ao qual pertencia a pulseira e antes de a colocar fiquei a olhar fixamente para a cicatriz. Passei o meu polegar por cima ao de leve, desenhando-a com o dedo e enquanto o fazia a Carolina arrepiou-se. Para remediar o efeito que provoquei nela, beijei a marca na pele dela e coloquei-lhe a pulseira de novo. Ficou muito atenta depois daquele gesto e esboçou um enorme sorriso direccionado a mim. Pisquei-lhe o olho e puxei-a rapidamente para fora da cama antes que a preguiça se apoderasse dela novamente.


   Mal ouvi a água do chuveiro a correr, desci as escadas e fui fazer o nosso lanche. Já no piso de baixo, no meio de todos os papéis que haviam em cima da mesa reparei num meio florescente, quem quer que tivesse escrito aquilo tinha a intenção de chamar a atenção de alguém, como tal li descaradamente: ‘meninos, eu fui num instante buscar umas quantas coisas para o jantar. sei que posso confiar em ti Gonçalo. juizinho e portem-se bem.’ era apenas um bilhete da Dona Carmo mas sorri ao ler que podia confiar em mim. Bem, eu sabia que a Carolina amava sandes de queijo e tulicreme, pelo o que eu ouvi dizer já é uma coisa desde criança. Gostos são gostos, certo? Procurei o pão, o tulicreme e talheres e mal os juntei a todos no balcão preparei-lhe duas sandes dessas e fiz uma caneca de sumo de laranja. Pus num tabuleiro com dois copos e de seguida pus as sandes que preparei para mim, que em vez do tulicreme pus fiambre. Estava a subir as escadas e sem querer tropecei num degrau, raios! - tudo se manteve direito, andei o resto do caminho cuidadosamente até ao quarto dela, bati à porta e ouvi uma voz lá dentro.
       C.:'Estou só a acabar de me vestir!'
   Mas como o meu hábito não é esperar que as pessoas respondam, abri a porta de repente e só depois me entrou o que acabara de ouvir. Mal vi o corpo de Carolina só em roupa interior fechei os olhos e virei o corpo para o lado oposto rapidamente, nem os copos nem o sumo caíram. Eu nem sabia o que fazer, ou o que dizer. Senti o meu coração a disparar e as minhas bochechas rosaram enquanto a imagem da Carolina em roupa interior não me saía da cabeça. Tentei a minha sorte.
       G.:' Desculpa, foi sem querer, eu juro que não vi nada!'
       C.:'Cala-te parvo, não tornes isto mais estranho, já não é a primeira vez.'
   A nossa noite no rio, é verdade. Ouvia a Carolina a vestir-se rapidamente mas ainda assim parecia mais calma do que eu. As mãos tremiam-me e estava a tentar apagar aquela imagem da cabeça não fosse Deus castigar-me também… Já a tinha visto assim mas as circunstâncias foram diferentes, não? E porquê que me estava a sentir tão nervoso? Que merda.
       C.:'Já podes.'
   Eu virei-me na direcção dela outra vez e abri os olhos lentamente primeiro um e depois outro, estava tudo normal. Ela soltou uma gargalhada e eu também não pude evitar, a situação era ridícula e eu tornei-a ainda mais. Pousei o tabuleiro no chão e sentá-mo-nos de frente um ao outro em cima da carpete. Pelo olhar que deitava às sandes ela devia de estar esfomeada.
       G.:'Já podes comer, sabes?' - sorri.
   Depois de atacar-mos a comida que preparei como deve de ser e de eu lhe ter feito a cama (ela merecia), deitá-mo-nos os dois nela. Ambos ficamos pensativos ao olhar para o teto, talvez demais, até que a voz da Carolina quebrou essa corrente.
       C.:'O que tu me disseste é verdade?' - rodei a cabeça para olhar-lhe.
       G.:'Referes-te a quê?'
       C.:'Tu sabes… aquilo de não quereres estar sem mim...'
       G.:'Sim Carolina, é verdade.'
       C.:' E quando é que te apercebes-te disso?'
       G.:'Quando me ligaste a chorar e discutimos...'
       C.:'E porquê que não me voltas-te a ligar?'
      G.:' Porque quis negar os meus sentimentos, na minha cabeça tu é que me estavas a magoar e não o contrário, então fiquei chateado contigo e tu sabes como sou orgulhoso.'
       C.:'Obrigado, acho…'
       G.:'Pelo quê?'
       C.:'Por quereres fazer parte de mim.'

11 comentários:

  1. de nada Joana , sabes que é verdade*
    (viciei na música, adoro The Script *s*)

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  2. tecnicamente não está renovado, este era o design antes do que estava , mas sempre gostei muito dele, estava era a pensar noutra coisa :|
    De nada, sabes que gosto IMENSO (:

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  3. Muito obrigada , e deste gostas?
    Quando tiver inspiração posto, e pode ser que sejam um melhor capítulo da história, who knows :)

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  4. muito obrigada , eu identificava-me com os dois , foi difícil escolher :|
    espero pela tua , também :o

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  5. vou deixar estar , não quero estar sempre a mudar também, mas não me dou muito tempo com a mesma coisa (:
    eu também não, por isso é que tenho tentado fazer posts todos os dias, para não ficarem seguidos os da história :b

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  6. ahahah , é sempre bom deixar as pessoas na expectativa :b

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  7. gostaste mesmo, Joana?
    muito obrigada*

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