[Carolina]
- Traz essa mochila, se não te importares - pediu-me ele enquanto punha outra às costas.
Eram duas mochilas grandes, daquelas que se levam para acampar. A Galdéria Embeiçada batia palmas de júbilo e expectativa, até os seus olhos brilhavam. Eu não podia fingir que não sentia o mesmo, afinal de contas estava a encaminhar-me para uma surpresa que ele próprio preparara, só para mim. O Gonçalo caminhava ao meu lado, ou pelo menos tentava. Notava-se o esforço enorme que fazia para me acompanhar de muletas, especialmente para quem acabou de recuperar. Ao menos já tirou as ligaduras da cabeça. Ele nunca tinha feito caminhadas tão grandes. A maior que ele fez foi provavelmente do quarto ao frigorífico. Apesar das minhas tentativas falhadas para andar mais devagar isso chateava-o e ele repreendia-me. Carolina, eu estou bem, podes andar normalmente agora? Homens... A dignidade é o maior tesouro deles, nada pode abalar esta amiga. Mesmo que precisem de ajuda para limpar o rabo. Facto. Caminhamos mais um pouco e finalmente paramos. Uma paragem de autocarros? Franzi o sobrolho e ele leu-me a expressão.
- Aguenta, é surpresa - disse num tom calmo, ele sabia que me enervava mais.
- Sabes a quem estás a dizer isso, certo?
- Por isso mesmo - sorriu.
- Posso ao menos saber para onde vou?
- Nada, Carolina.
- Sabes que posso acusar-te por rapto?
- Depois vais agradecer-me.
- Não estás a ajudar - ele divertia-se ainda mais com a minha ansiedade.
- Nem tu a mim.
- O que diria a minha mãe sobre isto?
- Eu falei com a tua mãe.
A afirmação dele apanhou-me de surpresa. Ele falou com a minha mãe? Só para estar comigo? A Galdéria lançou-me um olhar que dizia 'eu avisei-te', retribuí-lhe mentalmente com o gesto do meu dedo do meio. Era impossível não sentir uma gotinha pequenina de ternura, portanto, o meu interior era uma cascata autêntica. Contudo, semicerrei os olhos com ar afectado pelo que ele tinha acabado de me admitir.
- Traidores - revirei os olhos.
- Não me obrigues a ser uma besta.
- Mais do que já és?
- Queres mesmo que eu mude de ideias, não queres?
- Não... - Disse eu como uma miúda amuada que não conseguiu ter os doces. - Afinal, o que falaste com ela?
- Isso não é suposto saberes, tal e qual como tudo o resto - disse ele, bastante sério.
- Odeio-te - sussurrei.
- Finalmente, uma camioneta! Não te aguento mais aqui.
Ao entrarmos, ajudei o Gonçalo com as muletas e ele subiu os degraus apoiando-se apenas no corrimão que existia nos dois lados da entrada. Empoleirou-se num ferro que apoiava a caixa que registava os nossos bilhetes e pagou-me o meu. Sentia-me mal por isso mas tinha sido ele a planear o dia e eu não esperava que fôssemos sequer a algum lado. Nota mental: estar em dívida para com ele, gomas do mesmo preço também são uma ideia a pensar. Quando me sentei e ele veio ter ao meu lado, com mais dificuldade do que aquilo que pretendia transparecer, apercebi-me que não prestara atenção ao destino da camioneta, nem quando ele pediu os bilhetes. Apercebi-me também que, no meu inconsciente, eu não queria saber verdadeiramente. Ok, nunca me fizeram uma coisa semelhante, parecida ou muito próxima a isto, daí que é especial para mim. E também por ser com o Gonçalo. Estava pronta para viver isto com a intensidade verdadeira de sentimentos que me ia proporcionar. Ou em português: seguir as regras dele.
Estávamos a meio do verão e o dia não podia estar com melhor tempo, apesar de um pouco abafado. A nossa viagem já durava 43min, estava desejosa para sair daquele meio de transporte que não continha ar condicionado e ainda era de manhã! Gotas de suor ameaçavam aparecer na minha testa e eu passava as costas da mão por ela de três em três minutos. Que inferno!
- Gonçalo, estou a desesperar, está imenso calor.
- Só mais um pouco, está quase, prometo - disse ele, sinceramente.
Mais dez minutos passaram (já agora, para mim foram mil anos) e finalmente o Gonçalo tocou no Stop para sairmos na próxima paragem. Agarramos nas mochilas enormes e pusemos os pés em terra firme. Ahm, terra firme no meio do nada. Olhei para o meu lado esquerdo mas apenas vi mato, olhei para o meu lado direito e tive a mesma visão. Apenas existia uma estrada que separava ambos os lados. Francamente e para minha surpresa, há camionetas que passam por sítios destes. A Galdéria Embeiçada estava coberta de suor. Agitava o abanico para aliviar o calor e batia o pé no chão para um esclarecimento. Afinal não tinhas tanta razão. Após ele ajeitar-se nas suas muletas começou a avaliar-me, mas desta vez não queria saber se ele adivinhasse o que eu estava a pensar lá com os seus poderes psíquicos, aliás, eu queria que ele soubesse!
- Que foi? - Perguntei um pouco rude.
- Estás a gostar até agora? - Sorriu, sabendo PERFEITAMENTE aquilo em que estava a pensar.
- Mais surpreendida não podia estar, acredita.
- Anda, vais gostar.
- Vais de muletas para o meio da floresta?
- Não tenho outro remédio, pois não?
Isto ia ser interessante.
Eu queria mesmo achar que aquilo ia ser agradável, queria mesmo achar que iria ter uma surpresa que me fizesse apaixonar por ele loucamente. Ok, um pouco mais do que já estou. Mas enquanto estivesse rodeada de mosquitos, e nem estou a referir os bichos que se podiam encontrar por ali, não conseguia ter as certezas acerca disso. Apesar de ter espírito aventureiro, andar por sítios desconhecidos sem casas à volta para pedir socorro não fazia parte da minha lista.
- Tens a certeza de que estamos no sítio certo?
- Sim, Carolina - respondeu como se eu o tivesse a chatear.
- É esta a parte em que aparece o serial killer de moto serra na mão e nos corta em pedaços?
- Eu estou de muletas, não conseguia fugir mesmo se quisesse, ele ia ficar ocupado comigo enquanto tu fugias.
- Vou ter isso em conta.
Quanto mais nos infiltrávamos dentro da floresta mais eu tinha a certeza de que estava perdida. Nem sei como é que o Gonçalo sabia o caminho, se é que ele sabia, e pela primeira vez ele ia à minha frente. Desisti por completo de pensar no assunto, como eu disse antes: desfrutar e ser surpreendida. Não caminhamos muito até chegarmos a uma parte da floresta mais aberta. A vegetação passou de densa até sensivelmente nenhuma. Atravessamos essa área e tenho a dizer que era linda. Como era verão as flores estavam todas brotadas e davam-nos visivelmente um pouco acima do joelho. A brisa que as percorria era quente mas aliviava um pouco o calor do sol, nela levava pequenos dentes de leão que se iam espalhando pelo ar até desaparecer no meio das outras flores. As cores iam do amarelo, azul até ao branco, mas a cor dominante era o roxo. Estava maravilhada e arrependera-me nesse momento de não ter trazido a minha máquina fotográfica. Enquanto observava cada pormenor em meu redor o Gonçalo seguiu sempre, criando uma pequena distância entre nós mas bastou apenas correr um pouco para o alcançar. Ele olhou-me de relance e o meu sorriso era bastante óbvio, já estava mais que surpreendida.
- É tão lindo, Gonçalo!
- Eu sei, mas ainda não chegámos - sorriu-me calorosamente.
- Aposto que não é tão maravilhoso quanto isto.
- Não apostes já, vais perder.
Numa escala de um a dez, a minha expectativa foi de um mero 3,5 a um grandioso 1000! Começamos novamente a entrar numa parte um pouco mais carregada de vegetação, mas pouco coberta. Começou a ouvir-se um pequeno ruído de fundo que foi aumentando gradualmente e foi quando chegamos lá. Ele tinha razão, era bem mais bonito que o sítio anterior. Ainda estava calor mas o próprio sítio era refrescante. Era uma área ampla que continha algumas rochas umas em cima das outras que limitavam um pequeno rio que lá existia, estas eram grandes e planas, algumas continham musgo e davam acesso a esse mesmo rio. Na parte onde se concentrava mais água existiam umas pequenas cascatas que eram interrompidas em alguns sítios por árvores mais pequenas. O sol espreitava e ia de encontro com a água, o que tornava esta transparente e límpida. Era uma visão de sonho e estávamos apenas nós dois.
- Surpresa! - exclamou ele com um sorriso rasgado. - Gostas?
- É possível não gostar? - Perguntei ainda maravilhada. - É lindo, Gonçalo! Tinhas razão.
- Anda, vamos pôr-nos à vontade.
Segui-o e fomos parar a uma rocha que ficava no limite da água mas era grande e havia espaço suficiente para nos sentar. Ele tirou a mochila do ombro e eu repeti o movimento pousando-a para chegar-me perto da água enquanto o Gonçalo as abria. Pus-me de cócoras e mergulhei a minha mão vendo o reflexo distorcido da mesma pelas pequenas ondas da água agitada. Não estava muito fria, aliás, sabia bem num dia como aquele. Molhei a cara e um pouco o pescoço só para aliviar a superfície da pele que estava demasiado quente. Quando me virei estava uma manta estendida na rocha com uns tapetes de esponja para ser mais cómodo. Havia também lanternas e umas pequenas tochas que estavam apagadas, no meio da manta havia garrafas de água e umas pequenas cestas das quais imaginei que fosse o nosso almoço. Estava tudo demasiado perfeito. Arranjara tudo aquilo de muletas quase incapacitado só para uma rabugenta como eu. A essa altura já me sentia mais que especial. Fui ao encontro dele e parei quando ficámos frente a frente, eu sentia o meu sorriso a rasgar-se de orelha a orelha e ele olhou-me com ternura por ser ele o motivo desse mesmo sorriso. Passei-lhe as mãos molhadas pelo pescoço e senti a pele dele a arrepiar-se mas habituou-se rapidamente à sensação.
- Obrigado Gonçalo - disse eu sinceramente.
- Só quero que estejas feliz.
- Não podia pedir mais - sorri.
- Vamos comer? Está a fazer-se tarde.
- Claro, estou a morrer de fome!
Agarrou-me nos braços que estavam à volta do seu pescoço e beijou-me um de cada vez antes de os tirar. As pernas tremeram-me nas duas vezes que os lábios dele entraram em contacto com a minha pele, precisava de mais, o meu corpo pedia mais e eu só queria render-me. A ele. A nós. Ele dirigiu-me à manta para que me sentasse e a seguir fez o mesmo com cuidado. Abriu a cesta e tirou de lá variadas sandes, batatas fritas, sumo, croquetes, bolos (...) Que mais pode haver de melhor?!
- Diz-me, foi a tua mãe não foi?
- Nisso não dá para mentir - sorriu.
- Preparaste isto tudo no dia anterior? - perguntei antes de dar uma trinca numa das sandes.
- Praticamente - disse ele com a boca cheia.
- Só te safaste porque tens uma mãe que te atura e porque a minha mãe adora-te.
- Eu sei, mas porque elas te adoram também e querem que alguém gentil como eu cuide de ti - soltou uma gargalhada e eu fiz o mesmo.
- Que lamechas - gargalhei mais.
- Estás a gostar até agora?
- Estou a adorar Gonçalo, está tudo tão perfeito.
- Vais lembrar-te do dia de hoje por muito tempo. Espero - sorriu.
- Só me arrependo de não ter cá a minha máquina fotográfica - disse eu claramente aborrecida.
- Hmm... Não fales muito depressa.
Sacou uma das mochilas que se encontrava ao lado dele e tirou de lá a bolsa da minha máquina. Espera, como?!
- Estas a brincar com a minha cara? - sorriso de orelha a orelha.
- De nada - riu-se enquanto me entregava a máquina.
- Queres mesmo que fique louca por ti, não é?!
- Sim - riu-se.
- Acabaste de o fazer!
Rapidamente preparei a máquina e liguei-a. Não esperei nem mais um segundo para tirar fotos àquele sítio incrível e claro, ao Gonçalo.
- Estás a realizar praticamente todos os meus sonhos.
- O nosso lema é agradar - sorriu e eu arrepiei.
- Como é que conseguiste?
- A tua mãe veio a minha casa trazer o que eu pedi.
- Quando?
- Quando saíste de minha casa, liguei-lhe para ela vir cá sem saberes.
- Então foi por isso que ela demorou tanto tempo! - Disse eu surpreendida para sempre. - Vocês são os piores - ri-me.
- Só para te pôr esse sorriso na cara.
- Essa era desnecessária - disse eu sentindo as bochechas a arder.
- Eu gosto de ti assim.
Passou-me a mão pelo rosto e eu inclinei a cabeça para a mesma. Gosto da sensação que ele me dá no peito, que me dá na alma. Não quero ter que asfixiar este sentimento, quero perder o controle. Olhei-o por entre as pestanas mas ele já estava a olhar para mim. Precisava disto, da segurança que ele me dava. O dia ainda não tinha chegado ao fim e eu não poderia pedir mais. Ele sabe o que quero, sabe o que gosto e dá-me o que pode.
- Vamos para a água? - Perguntou ele.
- Como?
- Tem ali uma parte mais baixa.
- Sim mas eu não trouxe nada.
- Oh minha querida Carolina - disse ele no meio de um sorriso. - Já passamos por isto antes, lembraste?
Corei ao lembrar-me da noite que passamos em casa do meu tio. - Mas desta vez não temos nada para nos secar.
- Estava a brincar, trouxe um bikini para ti. Outra oferta da tua mãe.
- Mais alguma coisa?
- Apenas despacha-te - sorriu.
- Vira-te! - Ordenei e sorri também.
Ele obedeceu-me e eu comecei a despir-me. Oh céus, o que nós éramos e onde estávamos. O meu ego passou a ter mais de Galdéria do que de Embeiçada e ela estava à cuca, fazendo as minhas mãos suar só de pensar na expectativa disto tudo. Tirei a minha roupa interior e vesti rapidamente o bikini, peguei nas peças de roupa e arrumei-as num canto, teria vergonha se ele visse.
- Já podemos.
- Finalmente! - Disse ele para depois tirar a t-shirt. - Se conseguisse pegar em ti ao colo era o que faria, mas vamos ter que nos contentar em ir a caminhar até à água.
- Com sorte não cais - gargalhei.
Dirigimos-nos à água e ele deu-me a mão, sentámos-nos devagar e ficamos apenas com as canelas submersas. Ele deu-me um beijo no ombro, que ficou em brasa, e desceu para mergulhar mais o corpo. Abriu-me as pernas criando espaço para ficar no meio e puxou-me para ele. O meu baixo ventre começou a ficar dormente e o Gonçalo acabou por aterrar a cabeça no meu peito. A Galdéria Embeiçada tinha-se preparado para isto, mas quando chegou a situação essa preparação não foi suficiente. Pousei o meu queixo no topo da cabeça dele e rodeei o seu corpo com os meus braços. Estaria ele a testar-me? Tantas sensações desconhecidas que percorriam o meu corpo e só ele conseguia desencadeá-las. Os dedos dele percorriam-me as coxas o que fez com que a minha respiração se tornasse mais profunda. Moveu a cabeça e inclinou-a para me olhar, eu fiz o mesmo. Ainda tinha arranhões na cara e cicatrizes feias dos pontos que levou na cabeça, mas para mim ele nunca tinha estado tão lindo e tão sincero.
- Quero-te, Carolina.
- Também te quero, Gonçalo - ambos saíram num sussurro que só nós dois podíamos ouvir.
Ele puxou-me mais para si e levou-me para dentro de água. Arrepiei-me por momentos mas o corpo quente do Gonçalo fez-me habituar rapidamente à sensação. Fiquei com as minhas pernas à volta da sua cintura e os meus braços em redor ao seu pescoço. Ele mergulhou-nos aos dois e quando voltamos à superfície ainda nos olhávamos. Como eu gostava deste rapaz. A mão dele passou-me pela cara e arrastou uma madeixa de cabelo molhado para trás, em conjunto com as outras. Viajou depois para o meu queixo e tocou-me mais uma vez no meu lábio inferior, só quando o fez é que me apercebi que o mordia. Ele aproximou o rosto dele ao meu e eu repeti-lhe os movimentos.
- Fica comigo - foi tudo o que consegui dizer.
Ele beijou-me, puxou-me mais para si e finalmente senti todos aqueles choques aos quais o meu corpo não está habituado. Entreabri os lábios e as nossas línguas encontraram-se durante muito tempo, num beijo aprofundado. As minhas pernas cada vez mais faziam pressão contra ele e toda eu estava em chamas. Eu queria-o e ele queria-me a mim.
leio-te há tanto tempo que nem sei há quanto, juca, e opá, estás cada vez melhor!! **
ResponderEliminarown! obrigado linda, é tão bom saber isso!
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